Programa inovador combate depressão em pessoas com mais de 60 anos

Um programa de intervenção, denominado “Treino Metacognitivo para pessoas mais velhas com depressão (MCT-Silver)”, coordenado no nosso país por Lara Guedes de Pinho, professora do Departamento de Enfermagem e investigadora no CHRC - Comprehensive Health Research Centre, da Universidade de Évora (UÉ), está a ser aplicado no Hospital Garcia de Orta a pessoas com mais de 60 anos, pretendendo-se que seja implementado também noutros hospitais do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

Trata-se de uma intervenção em grupo, criativa e inovadora, que tem como objetivo reduzir os sintomas depressivos desafiando as crenças cognitivas e metacognitivas características desta perturbação, “como por exemplo, ter uma perspetiva mais realista e mais positiva das situações do quotidiano” realça a investigadora da academia alentejana.

O objetivo é “capacitar os participantes para reconhecerem e corrigirem os seus padrões de pensamento automáticos e disfuncionais e o comportamento” começa por explicar a professora da Universidade de Évora indicando que esta estratégia foi igualmente aplicada pela equipa de investigadores liderada por Brooke Viertel, da University Medical Center Hamburg-Eppendorf, na Alemanha, demonstrando “resultados positivos”.

“Em Portugal quando a pessoa é diagnosticada com depressão é a prescrição de antidepressivos a primeira abordagem recorrendo-se pouco à psicoterapia” frisa, salientando que “há muito poucas respostas não farmacológicas no SNS, como complemento à medicação, para o tratamento e reabilitação psicossocial desta patologia” avança Lara Guedes de Pinho, destacando aqui a importância deste tipo de intervenções, uma vez que, tal como sublinha “a depressão é uma das perturbações mentais mais frequentes em pessoas com mais de 60 anos e uma das maiores causas de anos vividos com incapacidade”.

“É aliás, muitas vezes, a depressão que leva à dependência e não a doença física. Por exemplo, quando a pessoa fratura o fémur, necessita de reabilitação física para recuperar a mobilidade. Se ao mesmo tempo tiver depressão, não vai ter motivação para a reabilitação, ainda que tenha capacidade física. Assim, a depressão é muitas vezes a causa da dependência e não o problema físico existente.”

A professora da UÉ nota que “a pessoa com depressão tem pensamentos ruminantes e pensamentos negativos constantemente, pelo que é importante capacitá-la para pensar sobre o seu próprio pensamento, modificando-o”.

Para Lara Guedes de Pinho “a pessoa com depressão foca o seu pensamento nos aspetos negativos de uma dada situação e tem dificuldade, ou é mesmo incapaz, de considerar os aspetos positivos, pelo que o Treino que sugerimos vai ajudá-la a refletir sobre os seus pensamentos e a visualizar alternativas positivas dessa mesma situação, tentando reduzir os pensamentos negativos”. Realça-se que “todos nós temos vieses cognitivos, pelo que podemos e devemos treiná-los”, esclarece.

A professora da Universidade de Évora deixa o exemplo: “quando uma pessoa com depressão, por exemplo, organiza uma festa para familiares e amigos e todos elogiaram a festa, basta uma pessoa ter dito, por exemplo, que o bolo estava demasiado doce para que esse detalhe seja o foco do seu pensamento e a pessoa conclua que a festa foi um fracasso”. No Treino agora desenvolvido pretende-se “que a pessoa possa focar-se nos aspetos positivos e consiga ver a realidade como um todo”.

Esta estratégia é “importante para a sociedade” considera Lara Guedes de Pinho porque oferece uma intervenção específica para “reduzir a depressão na sociedade, melhorar a funcionalidade, o bem-estar e a qualidade de vida, que são ingredientes essenciais para um envelhecimento ativo e saudável” resume a investigadora.

Num estudo recentemente publicado no Journal of Personalized Medicine por uma equipa de investigadores da Universidade de Évora da qual Lara Guedes de Pinho integra, sobre este tela é realçado que “a população idosa é inequivocamente um extrato da população que carece de cuidados de saúde especializados nesta fase da vida”, onde a “multimorbidade e a perda da funcionalidade resultam no processo de envelhecimento que pode exigir cuidados prestados por outras pessoas em contexto domiciliar. Os cuidadores informais surgem com especificações para aprender e autogerenciar a sobrecarga de cuidar de uma pessoa dependente.

Esta investigação conta com a colaboração de investigadores do CHRC, estudantes do Mestrado em Enfermagem de Saúde Mental e Psiquiátrica e do Doutoramento em Ciências e Tecnologias da Saúde e Bem-Estar da Universidade de Évora financiado pelo Acordo de Cooperação Científica entre Portugal e a Alemanha pela FCT no biénio 2022/2023.

Publicado em 21.01.2023